A minha cidade estava hoje nostálgica por ser dia de natal.
As pessoas passeavam nela de andar vagaroso e labiríntico entre ruas de calçada gasta e irregular como é de modo medieval a preservar.
Familiares distantes que por cá permaneceram estes dias, aceitam que os leve em digressão pela estranha cidade recheada de história, grande parte dela por contar.
Puxo dos galões e disserto sobre a cerca velha, delimito os espaços romanos e os medievais, enquanto corre a brisa fresca do fim de tarde, agradável e cúmplice.
Ali descrevo o espaço onde o duque D. Fernando de Guimarães, pernoitou esperando vir a assistir ao casamento de uma das filhas do rei D. João II, que em Évora pretendia casar. Afinal o duque era surpreendido com um cadafalso erguido na praça grande ( a do Giraldo) por ter sido infiel ao rei.
Naquela praça estão os sinais dos Estaus, dos paços do concelho, da cadeia e dos lugares de mercadores judeus, bem como o caminho que leva ao convento de S. Domingos onde os restos do duque repousariam depois do espectáculo da sua morte por traição.
Ergo os braços e aponto lugares de tanta história por contar, que permanece recôndita, que procurada, facilmente falará de actos de resistência de um Manoelinho, mas que por ser tolo nunca foi levado a sério. Afinal tratou-se de resistir com êxito ao domínio Filipino, mas tão pouco os tolos falavam de política naquele tempo. Eis assim um exemplo da misteriosa história da minha cidade por contar.
Nesta cidade nasci e nela permaneço quase sempre, entre gente com aspecto sereno, que prefere esperar o dia em que todos acreditarão na justiça e no bom senso, mesmo que um dia tenham que conspirar contra qualquer rei, assumindo-se como tolos.
O Natal na minha terra é silencioso como todos os acontecimentos que sempre se impuseram entre cristãos, judeus e mouros, que por cá sempre viveram.
Entre eles há sempre um Manoelinho e ninguém sabe onde ele está, mas sabe-se que mesmo tolo ele tocará a rebate para a derradeira conspiração anónima de todos os eborenses.